Um grupo multidisciplinar de pesquisadores da Finlândia (Universidade de Turku e Universidade de Helsinki) e da Suécia (Universidade de Skövde) recentemente encontrou evidências de que a hipnose pode modificar o processamento de um estímulo alvo antes que ele atinja a consciência.
As experiências demonstram que é possível modular hipnoticamente mesmo as características mais automáticas de percepção, tais como as experiências de cor. Os resultados foram apresentados em dois artigos publicados nas revistas “PLoS ONE” e “International Journal of Clinical and Experimental Hypnosis”. A parte finlandesa da pesquisa é financiada pela Academia da Finlândia.
A natureza das mudanças na percepção causadas pela hipnose tem sido um dos principais temas de controvérsia durante a história da hipnose. As principais teorias atuais da hipnose sustentam que usamos sempre ativamente a nossa própria imaginação para alcançar os efeitos de uma sessão de hipnose. Por exemplo, a ocorrência de alucinações visuais sempre requer o uso ativo do objetivo imaginário dirigido, e esse fenômeno pode ser experimentado com e sem a hipnose.
O estudo publicado na “PLoS ONE” foi feito com dois participantes altamente sensíveis à hipnose, que poderiam ser hipnotizados e desipnotizados usando apenas uma única palavra-chave. Os pesquisadores mediram as atividades cerebrais oscilatórias dos participantes em resposta a uma série de imagens exibidas rapidamente a eles: formatos geométricas – quadrados, triângulos ou círculos – nas cores ou azuis ou vermelhas. Os participantes foram hipnotizados e receberam algumas dicas de que certas formas sempre possuíam uma determinada cor (por exemplo, os quadrados são todos vermelhos).
Um participante informou que havia experimentando constantemente uma mudança na cor do objeto imediatamente quando uma forma sugerida aparecia na tela (por exemplo, ver um quadrado vermelho quando a cor real era azul). Os pesquisadores descobriram que esta experiência foi acompanhada de aumento da atividade cerebral de alta frequência logo 0,1 segundo após o estímulo aparecer, além de ter sido apenas observada em resposta às formas mencionadas nas dicas.
O segundo participante não experimentou nenhuma mudança de cor nem uma atividade cerebral diferente. No entanto, relatou uma sensação peculiar quando um formato anteriormente mencionado era apresentado. “Às vezes eu via e percebia que uma forma tinha a cor vermelha, mas o meu cérebro me dizia que ela tinha uma cor diferente”.
Este aumento na atividade cerebral oscilatória reflete a comparação automática de entrada para as representações de memória. Neste caso, a sugestão hipnótica “todos os quadrados são vermelhos” levou a um traço de memória que foi ativado automaticamente quando um quadrado foi apresentado.
Além disso, para o primeiro participante, o efeito foi forte o suficiente para substituir a cor real do quadrado. A correspondência deve ter ocorrido de forma pré-consciente, no momento inicial do efeito, por isso a mudança de cor imediata. Além disso, ambos os participantes relataram ter realizado o teste sob efeito da amnésia pós-hipnótica, sem memória consciente das dicas sobre a cor das figuras.
No artigo publicado na “International Journal of Clinical and Experimental Hypnosis”, o mesmo primeiro participante foi testado em um tipo de configuração semelhante. Nesse experimento, porém, foram coletados apenas os dados de comportamento, incluindo a precisão e os tempos de resposta no reconhecimento de cor.
Estes resultados mostram que uma sessão de hipnose afeta a percepção das cores de um determinado objeto antes mesmo da pessoa se tornar consciente da figura – como aconteceu com esse participante. Além disso, ele não foi capaz de alterar a sua experiência com os objetos apresentados visualmente sem o uso da hipnose. Ou seja, ele não conseguiu fazer com que as informações que já possuía em seu imaginário se sobrepusessem à força da hipnose.
É importante ressaltar que ambas as experiências foram feitas usando uma sugestão pós-hipnótica. O efeito foi sugerido durante a hipnose, mas a experiência foi sugerida para ocorrer após a hipnose. Assim, todos os experimentos foram realizados enquanto os participantes estavam no seu estado normal de consciência.
Este resultado indica que, utilizando a hipnose, é possível criar um traço de memória que influencia as fases anteriores e logo o início do processamento visual, já cerca de 0,1 segundo após o aparecimento de um alvo visual. Este resultado tem implicações importantes em psicologia e neurociência cognitiva, especialmente quando se estuda a percepção visual, a memória e a consciência.
Por Bruno Calzavara [Medical Xpress]
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