No clássico "A Montanha Mágica" Thomas Mann coloca na boca de um médico, o doutor Krokowski, palavras que se tornaram célebres: "Os sintomas da doença nada mais são do que uma disfarçada manifestação do poder do amor; toda doença é uma paixão transformada." Não se trata, propriamente, de uma afirmativa original; já o dissera o poeta alemão Novalis, no começo do século XIX: "Nossas enfermidades são resultado de uma sensibilidade exagerada."
Esta é uma idéia antiga. A medicina hipocrática fala dos humores, que governam o nosso temperamento e nos tornam sujeitos a certas doenças. Um destes humores é o sangue. A pessoa que tem temperamento sanguíneo é vivaz, cheia de energia. Mas se há excesso de sangue - a pletora - pode ocorrer uma apoplexia, ou seja, um acidente vascular cerebral de tipo hemorrágico. Pletóricos eram tratados com sangria, cujo objetivo era remover o excesso de sangue.
A medicina chinesa distingue entre as causas externas do doença (clima, alimentação) e causas internas, que são basicamente emocionais. Mais recentemente criou-se a expressão doença psicossomática, para designar aquela situação em que os problemas emocionais geram doença, através sobretudo do estresse - outro termo moderno, este cunhado por Hans Selye. Na Universidade de Washington foi organizada uma escala de estresse, com pontuação; um dos valores mais altos (73 pontos) corresponde ao divórcio.
Seja através dos efeitos somáticos (hormonais, imunitários) seja através das repercussões na mente, as paixões reprimidas, contrariadas ou mal-sucedidas adoecem as pessoas. Isto ficou muito claro à época do longo (1837-1901) reinado da rainha Vitória na Grã-Bretanha. Entre os vitorianos a repressão sexual, através de uma educação em que o castigo corporal era a regra, podia gerar perversões que às vezes chegavam ao crime, como o mostra a sombria trajetória de Jack, o Estripador.
Também eram freqüentes os casos de histeria. O nome, que vem do grego hysteron, útero, mostra que o problema era considerado principalmente feminino, ainda que homens não estivessem imunes a ele. Vários quadros eram descritos. Em primeiro lugar, o ataque histérico propriamente dito: a mulher alternadamente chorava ou ria, tinha convulsões semelhantes à da epilepsia, eventualmente desmaiava. A paciente às vezes queixava-se do globus hystericus, uma sensação de bola na garganta. Também podiam ocorrer paralisias histéricas, em geral de um braço - sem que a paciente se mostrasse impressionada, situação descrita como la belle indiférence, a bela indiferença.
Estes casos foram estudados, a partir de 1870, pelo famoso doutor Jean Martin Charcot, em Paris. Com ele, estagiava um jovem médico vienense, Sigmund Freud. Discutindo com Charcot a origem da histeria, Freud ouviu dele uma afirmação reveladora: "C\\`est toujours la chose génitale", é sempre a coisa genital. A partir daí Freud começou a desenvolver a teoria da qual resultaria a psicanálise, na qual a repressão da libido é vista como causa de doença psíquica.
Adoece-se de paixão contrariada, morre-se de amor não correspondido. Esta era uma visão freqüente na época romântica, em que jovens poetas e artistas morriam mesmo muito cedo (mas de tuberculose, como foi o caso de Castro Alves). A isto deve-se acrescentar os casos de suicídio, de alcoolismo, de uso de drogas.
Mas o amor ajuda a viver. Não estamos falando só da preservação da espécie humana; o amor, o carinho, preservam a vida. A expectativa de vida de casados que estão juntos há muito tempo é bem maior que a de solteiros, de divorciados, de viúvos. O Elixir do Amor, que dá título à ópera de Donizetti, é também o elixir da longa vida.
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