Imagine a cena: você está sozinho em casa e, quando olha para o chão, vê uma tarântula como essa da foto andando em sua direção. Para piorar, você tem pavor de aranhas. O que faria? Muitas pessoas recomendariam que você tentasse ver o bicho como algo não tão assustador e tentasse minimizar o medo que ele lhe provoca – essa é uma abordagem muito usada por psicólogos para ajudar pacientes com fobias, na verdade.
Mas um estudo da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), a ser publicado em breve na revista científica Psychological Science, sugere que o melhor a fazer é justamente o oposto disso. Segundo ele, assumir e se deixar livre para descrever suas emoções é que pode diminuir o medo e a ansiedade.
Para chegar a essa conclusão, pesquisadores pediram a 88 voluntários com fobia de aranhas que tentassem chegar o mais próximo possível de uma tarântula (grandona e vivona) que estava dentro de uma caixa ao ar livre, até mesmo tocando-a se conseguissem (ninguém foi forçado a fazer isso; os pesquisadores não eram sádicos nem nada do tipo).
Então esses voluntários foram divididos em quatro grupos e sentaram-se diante de outra tarântula que também estava dentro de uma caixa, mas dessa vez todos estavam em um local fechado. Os indivíduos do primeiro grupo tiveram que descrever as emoções que estavam vivenciando e classificar livremente suas reações para com a tarântula. Por exemplo, podiam dizer algo como “estou paralisado de terror com essa arranha horrorosa, imensa e assustadora”.
Em um segundo grupo, eles podiam se expressar, desde que usassem palavras mais neutras que não fizessem nenhuma referência ao medo ou nojo que estavam sentindo. Também deviam falar de modo a fazer parecer que a experiência não era tão assustadora assim. Então, deviam dizer coisas como “essa aranhazinha não pode me machucar, não estou com medo dela”.
Como explicou a líder do estudo no Medical Xpress, a professora de psicologia da UCLA Michelle Craske, “essa é a abordagem mais comum usada para ajudar pessoas a confrontar coisas que elas temem”. Normalmente, tenta-se ajudar os outros a pensarem diferente sobre aquela experiência emocional, mudando a forma como enxergam o objeto de seu medo. Isso, aliás, é o diferencial a respeito da pesquisa. “No primeiro grupo, não houve nenhuma tentativa de mudar a experiência. Apenas quisemos que eles descrevessem o que estavam sentido”, completa Craske.
Em um terceiro grupo, os voluntários tiveram que apenas dizer algo irrelevante sobre a experiência e, no quarto grupo, não puderam dizer nada.
Todos eles passaram novamente por esse teste uma semana depois, mas dessa vez em um ambiente ao ar livre. Então os pesquisadores mediram quão perto cada um conseguiu chegar da aranha, quão estressados estavam e que respostas psicológicas deram, focando particularmente na quantidade de suor em suas mãos – um bom indicativo de medo, segundo Craske.
Qual dos quatro grupos você acha que mostrou menos pavor após uma semana?
O estudo concluiu que foi o primeiro. Os seus integrantes foram capazes de se aproximar muito mais da tarântula do que os dos outros, especialmente em relação ao terceiro grupo (o que teve de comentar coisas nada a ver), e as suas mãos estavam suando significativamente menos do que os participantes de todos os outros.
“As diferenças foram grandes e os resultados são ainda mais significativos quando consideramos o pouco tempo envolvido [só uma semana]. Com um tratamento mais completo, os efeitos podem ser ainda maiores”, disse a autora. Ela confirmou que se expor aos próprios medos é uma medida eficiente para vencê-los, mas disse ter se surpreendido com o fato de que permitir que a pessoa se expresse com um mínimo de intervenção tenha funcionado tão bem.
Legal, mas por que o primeiro grupo se saiu melhor? Ela explica: “Quando os aracnofóbicos dizem ‘Eu estou apavorado com essa aranha horrível’, eles não estão aprendendo algo novo, estão apenas dizendo exatamente o que estavam sentindo. Em vez de apenas sentir, eles estão dizendo isso. Por alguma razão que não entendemos completamente, essa transição é o suficiente para fazer a diferença”.
Os cientistas também analisaram as palavras utilizadas. Aqueles que usaram um número maior de palavras negativas se saíram melhor, tanto em termos de quão perto estavam dispostos a chegar da tarântula quanto à sua resposta no suor da pele. Em outras palavras, descrevendo a tarântula como aterrorizante realmente provou ser algo bom e ajudou a reduzir o medo.
Está aí outra surpresa, já que as terapias de exposição normalmente tentam levar a pessoa a pensar que aquilo não é tão ruim. E essa é uma crença popular. O professor Matthew Lieberman, coautor do estudo, diz: “Nós já publicamos uma série de estudos em que perguntávamos: ‘O que você acha que faria com que se sentisse pior: olhar para uma imagem perturbadora silenciosamente ou fazer isso tendo que escolher uma palavra negativa para descrevê-la?’”. Quase todo mundo disse que seria pior ter de olhar para a imagem e focar no negativo por escolher uma palavra negativa. “Elas acreditam que isso possa fazer com que nossas emoções negativas fiquem mais intensas. Bem, isso foi exatamente o que pedimos às pessoas para fazer no primeiro grupo, e deu certo. Nossa intuição aqui está errada“, completa.
Faz sentido. Como ele explica, ao verbalizar os sentimentos em uma situação de medo e ansiedade, as pessoas admitem que estão com medo, mas estão ali. Elas não estão tentando afastar a sensação e dizer que ela não é tão ruim.
Os bons resultados desse estudo agora animam os pesquisadores a estudar como essa abordagem pode ajudar as pessoas que sofreram traumas como estupro e violência doméstica, além de soldados com estresse pós-traumático.
“Eu acredito que isso possa trazer benefícios reais para as pessoas. “Há uma região no cérebro, o córtex pré-frontal ventrolateral direito, que parece estar envolvido em rotular os nossos sentimentos e reações, mas também está associado com a regulação de nossas respostas emocionais“, disse Lieberman. “Essa região do cérebro que está envolvida em simplesmente declarar como estamos nos sentindo parece silenciar nossas respostas emocionais, pelo menos em certas circunstâncias“. A razão disso ainda precisa ser estudada.
Ana Carolina Prado
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