terça-feira, 10 de abril de 2012

LEON ELIACHAR - As Flôres


Há dois meses que Iracema recebia flores, sem cartão. Colocava tudo nas jarras, vasos, copos; mesas, janelas, banheiro e até na cozinha. Quando o marido lhe perguntava por que tantas flores, todos os dias, ela sorria:
Deixe de brincadeira, Epitácio.

Ele não percebia bem o que ela queria dizer, até que um dia:
Epitácio, acho bom você parar de comprar tanta flor, já não tenho mais onde colocar.
Foi aí que ele compreendeu tudo:
O quê? Você quer insinuar que não sabia que não sou eu quem manda essas flores?
Foi o diabo, ela não sabia explicar quem mandava, ele não conseguia convencê-la de que não era ele.
Um de nós dois está mentindo — gritou, furioso.
Então é você — rebateu ela.

No dia seguinte, de manhã, ele decidiu não sair, pra desvendar o mistério. Assim que as flores chegassem, a pessoa que as trouxesse seria interpelada. Mas não veio ninguém:
Já são duas horas da tarde e as flores não chegaram, Epitácio. É muita coincidência.
Vai me dizer que não era você?

Ele não tinha por onde escapar. Insinuou muito de leve que a mulher devia ter conhecido alguém na sua ausência. Ela chegou a chorar e se trancou no quarto. A discussão entrou pela noite até o dia seguinte. Epitácio saiu cedo, sem mesmo tomar café. Bateu a porta com força e levou o mistério para o trabalho.
Meia hora depois, a mulher saiu e foi ao florista.
Como vai, Dona Iracema? A senhora ontem não veio, heim? Aconteceu alguma coisa?

À noite, Epitácio viu as flores e não disse uma palavra, mas a mulher não parou:
Seu cínico. Bastou você sair para as flores aparecerem e ainda tem coragem de dizer que não foi você.
Nessa noite ele teve insônia.


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