sábado, 9 de março de 2013

FORCE O FACEBOOK A BANIR AS CAUSAS - Luís Antônio Giron

 Todo mundo virou uma causa em potencial. 
Mas a eficácia das petições é pouco mais que nula.


Tenho recebido avalanches de pedidos de amigos (amigos e “amigos”, bem entendido) do Facebook para que eu assine petições das mais variadas origens, intenções e fins, de moções para cassar mandatos de políticos corruptos do Congresso Nacional a requerimentos para salvar alces maltratados em um jardim zoológico do Connecticut, passando por requerimentos pela eliminação de pedófilos das redes sociais. Gostaria de solicitar que interrompam o achaque, pois não irei atender a nada nem a ninguém, por mais edificante que seja a intenção. Para mim, participar de uma dessas causas ou do Farm Ville é a mesma coisa.

A regra se aplica obviamente às petições. “Petição” consiste em um termo americanizado para designar abaixo-assinado. No Brasil, até o Facebook, petição era, segundo o Dicionário Aurélio, a “formulação escrita de pedido, fundada no direito da pessoa, feita perante o juiz competente ou que preside ao feito”. Portanto, petições no Brasil não têm nada a ver com as americanas, que não passam de documentos que visam a pressionar esta ou aquela pessoa ou instituição a mudar uma orientação ou uma rotina. O termo deturpado ficou popular por causa do perfil “causas” do Facebook – este, por sua vez, também ele uma distorção da realidade.

As “causas” (conjunto de ideias e princípios que um cidadão ou um grupo de cidadãos está disposto a defender por qualquer motivação) e se tornaram os eventos mais pegajosos e repugnantes do Facebook. A rigor, qualquer cidadão pode liderar uma causa – e, no fim das contas, ele próprio se tornar uma causa. Basta se apresentar como tal para seus amigos na rede social – e criar uma lista de pressão com o fim de alcançar determinado objetivo.

A verdade, no entanto, é que tais missões são inócuas. Evoco dois motivos para isso. O primeiro é que elas são emanações caóticas e particulares. Trata-se de uma contradição nos termos: como atuar no âmbito político e social em um meio monitorado e comercialmente interessado nas informações de cada cidadão? É como se o Grande Irmão do romance 1984 de George Orwell desse espaço ao desabafo e ao protesto, na certeza de que nada irá acontecer. Os ingênuos pensam que, apoiando petições, politizam o Facebook. Mas, na realidade, o Grande Irmão está se valendo dos dados dos pseudo-rebeldes para vender anúncios e produtos. O Facebook privatiza o engajamento político.

O segundo motivo da ineficácia das grandes causas sociais e políticas no Facebook é que elas são criadas e disseminadas no universo paralelo online. Não se fundam, portanto, na realidade material, no cotidiano concreto dos cidadãos, neste imenso, sangrento e malcheiroso mundo offline. Os militantes das questões fundamentais do Facebook parecem aqueles avatares que esvaziaram sete anos atrás no site Second Life. Como estes, o Facebook oferece uma contrafação digital da militância, por meio do avatar do revolucionário, aquele crente utópico que amontoa barricadas de kilobytes, pensando tratar-se de paralelepípedos - ou, pelo menos, imagina que pode redimir sua consciência culpada por um simples gesto de assinar um protesto digital. É uma forma de se livrar do problema e ser recompensado instantaneamente por isso. O agitador digital pensa assim: “Sou contra a pedofilia, a corrupção e o Mal. Se eu assinar a petição, mostro que sou um cidadão responsável e honesto e, por conseguinte, livro-me rapidinho do encargo”. Pobre diabo: é consumista e não sabe.

Ora, se a realidade de fato não corresponde exatamente à online, a inconsistência ganha um enorme impulso para se expandir, sem consequências para o mundo propriamente dito. Que diferença faz querer obrigar o Facebook tirar do ar as páginas de pedofilia se o gesto não vier acompanhado de uma medida efetiva por parte das forças da lei? Nada. Para não falar nas injustiças que são cometidas com muitos animais de cativeiro mundo afora. Eles continuarão a ser torturados e a render anúncios, quer protestemos, quer não.

E como cassar o mandato de um senador, quando ele foi eleito por voto popular ao cargo? Será difícil derrubá-lo via petições virtuais, como sonham os ativistas das causas do Facebook. Estes creem que a rede social servir como instrumento de dissuasão. Mas só mesmo a lei é capaz de fazê-lo. Por isso, esse tipo de abaixo-assinado faz lembrar histórias da Carochinha. Na verdade, as petições que exigem a derrubada de políticos não têm sentido. Não passam de manifestações inconsequentes, que tendem a jamais extravasar para as ruas. O único objetivo delas é fazer com que o cidadão afirme sua indignação em ambiente seguro, sem correr risco. Ele participa de mentirinha do processo político. Quero ver esses inventores de causas irem ao asfalto, fazer piquetes e erguer barricadas. Obviamente não irão fazê-lo, pois são muito digitais para atos de coragem real .

Por todos os motivos expostos, e já que qualquer um pode ter ou ser uma causa, lanço uma neste instante. Seu lema é: “Force o Facebook banir as causas”. Minha causa é contra as causas. É uma anticausa. Porque, se essas são as causas que os internautas desejam levar adiante, são menos causas que palavras cuspidas ao alto no meio do vazio da segunda vida oferecida pela internet. Ao banir as causas, vamos eliminar o motivo delas. . O que pode ser um bom recomeço para a genuína politização. No Facebook, o protesto é um efeito especial. 
 

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