terça-feira, 1 de janeiro de 2013

UM ATO DE AMOR – Luka Saint-Clair

Estava caminhando por um pequeno shopping, quando ouço chamarem meu nome seguidamente. Meu nome não é comum, o que me leva sempre a virar para tentar identificar a quem chama.
A voz parece bem familiar. Ela vem se aproximando enquanto tira os óculos . A reconheço imediatamente. Tínhamos tido uma relação de vários anos, intensa, feliz, mas com um final mal resolvido. Vou chamá-la, aqui, ficcionalmente, de Clara.
Quando a reconheci fiquei branco e sem saber o que falar. Ela sorrindo quase gargalhando e eu ali parado, com cara de estátua.
Clara. Inacreditável. Era a Clara. As últimas vezes que a tinha visto haviam sido em fotos no Facebook. Ela estava mais linda que nas fotos. Eu não a via já tinha mais de três anos e meio com certeza. Talvez quatro anos. Ela estava ainda mais bonita. E com o mesmo sorriso doce:
- Oi! Fala alguma coisa...Disse ainda rindo.
- Oi. Tudo bem? - respondi demonstrando ainda mais meu estado de choque. Eu estava preparado para tudo, menos pra encontrá-la.

Eu estava ali para comprar uma cortina para a casa que acabara de me mudar. Estava recomeçando a vida. Ela nem sabia que minha vida anterior havia acabado, muito menos que havia outra recomeçando.
Há 3 anos quase havíamos voltado, sem sequer havermo-nos visto pessoalmente. Ela estava na Europa e, por acaso, voltamos a nos falar pelo Skype. Daí pra paixão voltar foi só uma questão de poucas conversas e muitas lembranças. E, pela internet mesmo, resolvemos que ela terminaria o quase casamento dela, voltaria ao Brasil e a gente voltaria nossa relação. Havíamos nos apaixonado de novo, dessa vez via web. Conexão total. Mas coisas do destino nos levaram para outras histórias e isso nunca aconteceu. E ainda gerou uma briga que estava se encerrando naquele momento, anos depois.

E, ali estava eu. Parado sem conseguir realizar a presença dela, na minha frente, sorrindo como sempre e linda como nunca.

Ela perguntou o que eu fazia ali, eu disse e ela foi comigo comprar a tal cortina. Ajudou a escolher e enquanto estávamos na fila dos caixas, lotadas no final do ano, começamos finalmente uma conversa. Ela contou que estava casada há dois anos e com um filho de um. Claro que mostrou a foto. Lindo o bebezinho de olhos iguais aos delas. Quando saímos da loja ela me perguntou se poderíamos conversar um pouco. Ela nunca fora de dar muitas voltas, e desde a última vez que nos falamos há três anos, muitas coisas ficaram sem explicação.
Sugeriu que fossemos até o carro dela e até a praia.

Eu estava tenso, emocionado e assustado. Assim que saímos do estacionamento, ela começou sem nenhum rodeio a perguntar tudo que havia ficado sem explicação. Ela perguntava, mas não me dava tempo de responder. Ainda bem, porque eu não teria as respostas. Ela queria mesmo era falar.
Estava nervosa, emocionada e com imensa necessidade de desabafar. Aquilo devia estar engasgado há muito tempo. Decidi apenas ouvir com o máximo de atenção e carinho. Ela mesmo havia me ensinado a compreender me compreendendo.

Ela parou o carro numa das entradas da praia da macumba e começou a falar de como tinha se dado para mim de todas as formas possíveis, como amiga, mulher, cúmplice, companheira, incentivadora, sempre me passando confiança e tudo mais que um ser humano pode fazer de bom e de bem por outro. Na verdade ela não queria explicação alguma. Ela não estava cobrando nada. Só queria me falar tudo que sentira. Ela estava ali, chorando e me abraçando como se quisesse me esmagar contra si. Esmagar um sentimento que a fizera sofrer.

É claro que quis tudo com ela naquela hora. Voltar a ser casado, nunca mais parar de fazer carinho, proteger e abraçar aquela mulher que sempre me deu tanto. E aí, percebi que o que eu sentia por ela era realmente amor. Muito amor. Lembrei do facebook, do filho que ela sempre quis e eu não, da vida tranquila e feliz que a cadeirinha no banco de trás denunciava.

Naquele momento a desejei mais que a qualquer mulher no mundo e uma enorme atração que me invadiu por completo ao vê-la absolutamente linda me amassando contra seu peito e sentir sua boca a milímetros da minha, esperando pelo beijo que eu estava alucinado para que acontecesse. Eu nunca precisei ser tão homem quanto naquele segundo. Eu nunca precisei provar tanto meu amor por alguém quanto naquele instante decisivo. Eu não podia tirar dela a felicidade que ela conquistara depois do sofrimento que eu a impusera, desde que eu a deixara me esperando há três anos comunicando-a sem maiores explicações, através de um telefonema, quase lacônico, de que estava com outra mulher.
Ou eu saía do carro imediatamente ou a abraçava para sempre. Foi então que percebi todo o bem que ela havia me feito. Era maior do que o que eu imaginara antes. Percebi que todos os comportamentos que tenho capacidade de dedicar a quem gosto, toda a disponibilidade para fazer qualquer coisa que esteja ao meu alcance para fazer quem está comigo feliz, eu aprendi com ela.
Ela havia me ensinado a amar bonito me amando bonito.

Meu pensamento voltou para a realidade do que ocorria naquele carro. A amei mais ainda. Meu coração parecia que ia explodir de tanto carinho, ternura, amor e admiração por aquela mulher. E percebi porque nunca tinha entendido porque o motivo de havê-la deixado. Eu a amava mais do que podia. Na época em que havíamos sido casados, eu simplesmente não soube administrar meu ego. Ela me amava tanto e tão completamente que eu nem pensava no que sentia. Era um ingênuo, um egocêntrico que era tão amado que nem precisava pensar no que sentia. Que pouco demonstrava o quanto a amava e a seu jeito de me fazer sentir o melhor homem do mundo.

Eu havia mudado muito, e, hoje, era capaz de dar tanto amor quanto receber. Eu havia descoberto o prazer de amar bonito e de fazer a amada se sentir a mulher mais desejada de todas. Graças a ela.

Mas, a cadeirinha de bebê no banco de trás do carro importado, do ano e estalando de novo me trouxeram rapidamente para a realidade: se não houvesse aquele encontro ela continuaria a ser feliz e não estaria chorando como estava. Ser mãe sempre fora seu maior desejo e ela tinha muita dificuldade para engravidar. Em cada detalhe daquele carro havia algo que eu reconhecia dela. Ela tinha tudo que merecia, e eu não podia colocar isso em risco.
Eu havia tido minha chance de ser feliz com ela. Ela havia sido total e completamente minha mulher, tanto, que mais seria impossível. E ela havia sido mais.

Espero nunca me arrepender do que fiz. Dei um longo e carinhoso beijo naquela linda boca macia, chorei abraçado com ela por um longo tempo e pedi que ela não falasse nada. Desejei feliz Natal pra ela e pro filhinho lindo, que eu já amo mesmo sem nunca ter visto, e sai do carro.

Ela ficou parada me olhando sair andando pela frente do carro. Soluçávamos tanto, que dava para perceber os movimenos corporais característicos dos choros convulsivos. Minhas lágrimas quase não me deixavam ver as delas. Olhei para trás algumas vezes, até que ela arrancou, passou por mim e foi embora.

Talvez ela nunca saiba o quanto eu chorei de saudade aquela e outras noites, o quanto lembrei de tudo que ela havia feito por mim e de como éramos almas gêmeas tão felizes que, quando estão juntas, parece que o corpo de um se encaixava no outro como peça de quebra-cabeça. Naquele momento eu tive absoluta certeza de tudo o que ela havia modificado para melhor em minha alma.

Fiquei um longo tempo esperando o ônibus, segurando aquela sacola com a tal da cortina que havia ido comprar. Pensando em quanto bem ela havia me feito e esperando ter feito, ali, o melhor que poderia, por alguém tão absolutamente maravilhosa quanto Clara.

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